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domingo, 18 de julho de 2010

O Assédio Moral no ambiente de trabalho e suas repercussões

Assédio moral ou violência moral no trabalho não é um fenômeno novo. Pode-se dizer que ele é tão antigo quanto o trabalho. A novidade reside na intensidade, gravidade, amplitude e banalização do fenômeno nas relações laborais que vem ganhando novos contornos, através de estudos científicos, que sobre ele vem sendo desenvolvidos.
O assédio moral, também é chamado de manipulação perversa ou terrorismo psicológico. Dentre os termos mais comumente empregados para sua definição o termo Mobbing é utilizado para sua definição na Alemanha, Itália e países escandinavos, já na Inglaterra o termo preferido é bullying.
Mobbing (ou bullying) significa todos aqueles atos e comportamentos provindos do patrão, do superior hierárquico ou dos colegas, que traduzem uma atitude de contínua e ostensiva perseguição que possa acarretar danos relevantes de ordem física, psíquica e moral da vítima (Conceito de Márcia N. Guedes em sua obra Terror Psicológico no Trabalho).
São inúmeras as condutas que podem configurar o assédio moral no ambiente de trabalho, podemos exemplificar as formas mais comuns como: rigor excessivo; diligenciar tarefas inúteis ou degradantes ao empregado; exercer desqualificação ou críticas em público; ameaças e exploração de fragilidades psíquicas e físicas; exposição ao ridículo (Por exemplo: impor o uso de fantasias, sem que isso guarde relação com a função do empregado, e inclusão no rol de empregados com menor produtividade); divulgação de doenças e problemas pessoais de forma direta ou pública; atribuição de tarefas estranhas à atividade profissional do empregado, para humilhar e expor a situações vexatórias, ou ainda rebaixar de função (de médico para atendente de portaria, por exemplo); solicitação de trabalhos urgentes para depois jogá-los no lixo ou na gaveta; imposição de horários injustificados, dentre outras.
Assim, quando há nas relações laborais: abuso de poder, manipulação perversa e discriminação de forma continuada, entende-se que está configurado o assédio moral no ambiente de trabalho, sendo que a vítima pode ser tanto o empregado, quando assediado por um superior hierárquico, como o superior hierárquico, quando assediado por um grupo de empregados que querem de forma perversa excluir o chefe do ambiente de trabalho. Em ambos os casos, visa-se uma demissão forçada do assediado.
Além dessas formas típicas de assédio moral, tem se observado também hodiernamente o chamado ASSÉDIO MORAL ORGANIZACIONAL onde a empresa estabelece um conjunto de condutas abusivas, ostensivas e continuadas, objetivando a sujeição do trabalhador à sua exorbitante política de produtividade, ou seja, obriga o trabalhador à rigorosa política de resultado, muitas vezes humanamente inatingível.
O assédio moral traz inúmeras conseqüências às vítimas, afetando a vida pessoal, familiar e profissional do assediado, cujo efeito é o direito à indenização, tanto por dano material como e principalmente por dano moral, que ultrapassa o âmbito profissional, atingindo a dignidade e a honra subjetiva e objetiva do trabalhador (art. 5º, X da Constituição Federal).
A indenização por danos morais deverá ser fixada em valor razoável, a fim de traduzir uma compensação, para a vítima e, concomitantemente, punir patrimonialmente o agressor, a fim de coibir a prática repetitiva de atos dessa natureza. Já a indenização por danos materiais deverá ser fixada levando em consideração os efeitos patrimoniais pela perda do emprego e gastos com tratamento médico e psicológico.
Dependendo do caso concreto de assédio moral, poderá ser aplicada também a Lei nº 9.029/95, que veda a adoção de qualquer prática discriminatória para efeitos de acesso ao emprego ou sua manutenção por motivo de sexo, origem, raça, cor, estado civil, situação familiar ou idade, casos em que mesmo havendo a rescisão contratual por iniciativa do empregador, dão ao empregado o direito de vê-la declarada nula, com sua conseqüente reintegração no emprego e percepção de todas as parcelas do período de afastamento (art. 4º, incs. I e II, da citada lei).
O assédio moral pode ainda gerar a rescisão indireta (pela vítima) do contrato de trabalho. Conforme disposto no art. 483, da CLT (Consolidação das Leis Trabalhistas), além da autorização, nesses casos, da rescisão indireta, é autorizado ao empregador dispensar por justa causa o responsável, seja ele qual for, pelo ato ilícito ou abusivo praticado contra a vítima (art. 482, alínea b, da CLT).
Convém ponderarmos que a responsabilidade do empregador, nesses casos, por atos de terceiros (colegas, chefes, diretores, gerentes etc.), perante a vítima, é objetiva, ou seja, independe de sua culpa no evento danoso, havendo o dano tem a obrigação de repará-lo, por isso, importante uma política preventiva dentro das empresas, que vise um ambiente de trabalho sadio e satisfatório.
Além dessas repercussões já observadas, referente aos efeitos danosos na vida da vítima e das conseqüências jurídicas em relação ao contrato de trabalho, quando da ocorrência de assédio moral, a instabilidade criada no ambiente de trabalho, degrada-o, comprometendo a produção e a saúde financeira da empresa, pois se condenada, deverá indenizar pecuniariamente a vítima. Assim o assédio moral não é um bom negócio para ninguém, nem para o empresário, nem para os trabalhadores e menos ainda para a sociedade.

20 Anos do Estatuto da Criança e do Adolescente: Um olhar sobre a violência, criminalidade e proteção a crianças e adolescentes

No dia 13 de julho, o Estatuto da Criança e do Adolescente, completou 20 anos e ainda há muito que refletirmos sobre a legislação atual e a maneira que a sociedade a compreende, principalmente nas questões que envolvem violência, criminalidade e proteção a crianças e adolescentes.
- Violência e criminalidade:
Na sociedade atual a violência permeia todas as classes e está presente em quase todas as instituições. É um fenômeno complexo, onde um comportamento violento para um grupo pode ser considerado ato legítimo para outro.
A violência juvenil é um tema que tem perturbado a vida social e tem repercutido de forma alarmante nos meios de comunicação em todo o mundo. No Brasil tal fator tem gerado um clamor por medidas repressivas como a tramitação de leis que reduzam a idade da imputabilidade penal e até penas mais graves.
Podemos considerar que tal fator é causado por um tríplice mito: a) o hiperdimensionamento do problema, ou seja, casos isolados são generalizados, como se acontecessem cotidianamente, b) a periculosidade dos adolescentes, dissociada dos demais acontecimentos sociais e c) pelo mito da impunidade, ou seja, interpretar a lei através do senso comum, sem levar em consideração a atual legislação - Estatuto da Criança e do Adolescente, como uma legislação que prevê uma responsabilização para os atos daqueles adolescentes que eventualmente agem de forma violenta e praticam um ato infracional(crime).
A criminalidade por sua vez, não pode ser relacionada aos adolescentes de forma única e dissociada, tal fenômeno se deve a vários outros fatores como: níveis estruturais que tiveram esses jovens, fator sociopsicológico (papel das instituições na vida do jovem e da família) e individual (fatores biológicos, hereditários e de personalidade).
Sendo assim, só é possível termos uma noção realmente verdadeira sobre violência relacionada aos jovens se observarmos o problema de forma dinâmica e ampla.
Ao contrario do que muitos defendem o Estatuto da Criança e do Adolescente funda-se em um sistema de garantias constitucionais fundamentais e justificadoras de um Estado Democrático de Direito, onde está presente dentre outros, o princípio da Legalidade, considerado o equilíbrio entre o poder punitivo do Estado e o limite deste.
Tal princípio pode ser observado expressamente através do artigo 110 do Estatuto, que prevê que “nenhum adolescente será privado de liberdade sem o devido processo legal”, ou seja, toda vez que um adolescente comete um crime(fato típico, antijurídico e culpável), denominado na legislação como ato infracional, este deve ser apurado através do devido processo legal, tendo em vista que existe um sistema de punição/responsabilização a este adolescente, o qual deve ser acompanhado de igual forma por um Sistema de Garantias, e não mais um sistema protetivo da doutrina da Situação Irregular presente no antigo Código de Menores.
Devemos abandonar a idéia divulgada banalizadamente de que não existe uma responsabilização aos adolescentes que cometem algum ato infracional(crime), pois atualmente existe sim uma legislação que pune de forma coerente com os atos praticados.
Acredita-se que muito da visão de IMPUNIDADE se dá ainda pela confusão que se faz com a antiga legislação menorista, o Código de Menores e atual legislação, o Estatuto da Criança e do Adolescente.
O Código de Menores previa tratamento linear tanto a crianças e adolescentes que necessitavam de alguma medida de proteção, quanto a adolescentes que praticassem algum crime, assim comumente eram todos encaminhados para antiga FEBEM(Fundação do Bem Estar do Menor). Ainda hodiernamente se escuta discursos como: “Olha Joãozinho se você não se comportar, se você não comer, vou te entregar pro Conselho Tutelar”, ou ainda,”... vou te mandar para FEBEM”.
Convém esclarecermos que antiga FEBEM (Fundação do Bem Estar do Menor), para onde eram encaminhados tanto os adolescentes que cometessem algum crime/ato infracional, como aqueles que necessitavam de alguma medida de proteção, está extinta.
Desde a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente existe um sistema distinto. Para crianças e adolescentes que necessitam de alguma medida de proteção são aplicadas as medidas previstas no art.101 do ECA, levando em consideração as necessidades pedagógicas, visando sempre o fortalecimento dos vínculos familiares e comunitários, sendo a institucionalização o ultimo recurso.
Para os adolescentes que cometerem algum ato infracional(crime) existe responsabilização prevista no art. 112 do ECA que prevê as Medidas Sócio-Educativas(penas), dentre as quais encontra-se a medida de internação, que é a privação de liberdade do adolescente, e neste caso especifico existe a FASE (Fundação de Atendimento Sócio-Educativo) que trata-se de uma prisão, prisão semelhante ao sistema carcerário adulto, com a peculiaridade de quem deverá cumprir a pena em tal instituição é o adolescente que cometeu algum ato infracional(crime) grave.
O grande desafio sobre o tema, está ainda em como sanar tantas prioridades que estes jovens precisam se ao lado dessa busca existe uma sociedade cada vez mais punitiva e repressora, onde se justifica a punição como um bem aos jovens suprimindo-lhes direitos e garantias.
- A proteção – Novos avanços:
Por outro lado quando falamos no aspecto de proteção a crianças e adolescentes podemos observar um grande passo para uma mudança de realidade, que vem corroborar com os demais princípios do Estatuto da Criança e do Adolescente, que vale mencionarmos, pois recente, que é o projeto de lei proposto, no que trata a violência cometida por adultos contra crianças e adolescentes, que se aprovado pode ser considerado um grande avanço para o país no que se refere ao olhar dado para esses sujeitos.
Um dia após o Estatuto da Criança e do Adolescente completar 20 anos, (dia 14 de julho), foi encaminhado ao Congresso Nacional, projeto de lei que proíbe as palmadas e surras tidas culturalmente como formas de educar, aplicadas há séculos pelos pais aos filhos, sem que isso fosse visto como algo desabonador.
Tais atitudes poderão agora ser punidas com advertências, encaminhamentos a programas de proteção à família e orientação especializada. E não só os pais, os professores e cuidadores , também ficam proibidos de beliscar, empurrar ou mesmo bater em crianças e adolescentes.
Até então, o Estatuto da Criança e do Adolescente, condenava os maus-tratos contra a criança e o adolescente, mas não definia se os maus-tratos seriam físicos ou morais. Com a alteração na legislação, o artigo 18 do ECA passará a definir "castigo corporal" como "ação de natureza disciplinar ou punitiva com o uso da força física que resulte em dor ou lesão à criança ou adolescente".
A alteração na legislação segue uma tendência mundial. Visa cumprir uma recomendação do Comitê da Convenção sobre Direitos da Criança das Nações Unidas, para que os países passem a ter legislação própria referente ao tema. Busca-se uma mudança cultural.
A Suécia desde 1979 possui legislação própria sobre o tema. Depois vieram Áustria, Dinamarca, Noruega e Alemanha. Atualmente 25 países têm legislação para proibir essa prática. Na América do Sul, até então, apenas o Uruguai e a Venezuela possuíam lei semelhante. Agora, vem o Brasil, que espera-se que aprove o referido projeto.
Tal mudança na legislação atual, traz agora para nosso país os avanços do resto do mundo, devendo a violência educativa ser banida do ambiente familiar e educacional que são os principais espaços que a criança e o adolescente tem para se desenvolver, espaços que devem ser seguros e não um campo de tortura.
O Estatuto da Criança e do Adolescente funda-se em um sistema de garantias constitucionais fundamentais e justificadoras de um Estado Democrático de Direito, e assim deve ser visto por toda sociedade e não mais como uma dissociação da realidade. Crianças e adolescentes devem abandonar o papel de objetos e passar a atuar como sujeitos de direitos e deveres, como cidadãos. Se o projeto de lei que prevê o fim das surras pedagógicas for aprovado com certeza representará um grande avanço e uma grande conquista no campo da infância e da adolescência, que após 20 anos de Estatuto, ainda tem muito a evoluir.